No final do mês de março, um grupo de estudantes de medicina da Universidade Federal do Paraná (UFPR) participou do Congresso Online Médico Universitário (Conbramed).
Entre os mais de 600 trabalhos inscritos (acesse os resumos aqui), cinco foram classificados para apresentação oral. Destes cinco, três são de alunos orientados por professoras do Setor de Ciências Biológicas (SCB).
Essa foi a primeira experiência dos estudantes com trabalhos cientÃficos, uma vez que estão nos perÃodos iniciais do curso. No congresso, eles puderam apresentar dados obtidos em revisão bibliográfica sobre tratamentos de pós-transplantes, de câncer e de queimaduras de pele.
Os estudantes Elizeu Daniel da Silva Junior e Daniel Pereira pesquisaram sobre os efeitos de dois medicamentos: o tacrolimus e microfenolato mofetil. Eles são utilizados por pacientes pós-transplantados ou por portadores de doenças autoimunes, como terapia de imunossupressão. Ou seja, para diminuir a defesa do organismo contra estruturas que ele não reconhece como suas. O trabalho teve a orientação da professora Djanira Veronez, do Departamento de Anatomia, e do médico Marcelo Alves Aranha.
O uso prolongado e a alta dosagem desses medicamentos podem causar efeitos adversos no sistema nervoso central (SNC), sendo os mais comuns a cefaleia e a confusão mental. Elizeu explica que o efeito tóxico no SNC ainda não é totalmente conhecido pelos cientistas da área. Porém, foi possÃvel identificar que as alterações podem ocorrer tanto na anatomia do cérebro, quanto a nÃvel celular.
O efeito dessas substâncias já é estudado no Departamento de Anatomia de forma prática. Após a retomada das atividades presenciais, os alunos pretendem atuar com esse objeto de pesquisa, conforme destaca Eliseu: “Eu penso em continuar a Iniciação CientÃfica com Neuroanatomia e Neurologia. O cérebro é uma incógnita. A quantidade de funções que ele tem me chama a atenção”, enfatiza.
Os alunos Wesley Rodrigues Zabot, Renata Trinkel Montanarin, Felipe Jorge Abdo e Matheus Senedese Rampazzo procuraram entender como as proteÃnas de choque térmico das células tumorais afetam o tratamento da carcinomatose intraperitoneal. A pesquisa teve orientação da professora Silvia Cadena, do Departamento de BioquÃmica e Biologia Molecular.
Esse tipo de câncer acomete a membrana de revestimento interno do abdome (peritônio) e, geralmente, origina-se de metástases de outros cânceres e tem difÃcil prognóstico. Como alternativa de tratamento, a técnica HIPEC utiliza-se da aplicação de substâncias quimioterápicas em temperaturas superiores à s do corpo humano. Isso provoca um choque térmico no ambiente tumoral, ativando a expressão de proteÃnas, que podem ter efeitos benéficos ou não para o paciente.
No cenário positivo, elas induzem a uma resposta imune ao câncer, que podem atuar como uma “vacina antitumoral”. Em contrapartida, outras pesquisas mostram que, após a aplicação, as proteÃnas podem impedir a morte programada de células tumorais remanescentes do tratamento. Pode haver ainda a liberação de alarminas, compostos que podem baixar a imunidade do paciente e torná-lo suscetÃvel a outras doenças.
Renata destaca que a “transição entre o conteúdo das aulas clássicas para a aplicação em um contexto oncológico foi bastante enriquecedor”. Wesley aponta que o diferencial do tema escolhido foi decisivo para a boa classificação no congresso. “Essa abordagem molecular em um congresso de medicina é diferente do que esperam em um evento como esse”, resume.
A técnica mais utilizada para o tratamento de queimaduras de terceiro grau é o desbridamento, que consiste na limpeza do ferimento seguida do enxerto da pele. Porém, as alunas Larissa Helena Tissi e Helena Schmidt estudaram outras alternativas que têm sido investigadas por cientistas. A pesquisa teve orientação da professora Maria Cristina Leme Godoy dos Santos, do Departamento de Biologia Celular.
Uma delas é a técnica Meek, na qual o enxerto, antes de ser colocado na pele, passa por uma prensa que expande o tecido. Dessa forma, o enxerto pode cobrir uma superfÃcie maior do corpo do que sem essa preparação.
A segunda técnica é a utilização de uma matriz de regeneração dérmica, composta por colágeno, silicone ou outros compostos na base da ferida. Essa matriz estimula a formação de vasos sanguÃneos e das camadas mais profundas da pele. O conjunto matriz + ferida é coberto com uma camada adesiva com tubos de sucção, que retiram o lÃquido da ferida e contribuem para uma regeneração mais ágil.
Elas explicam que a Meek ainda não é plenamente utilizada no Brasil, mas apresenta resultados promissores. “Há menor tempo de cura, de hospitalização e maior taxa de sobrevivência”, destaca Helena. A matriz em pressão negativa também é pouco usada e está em fase de pesquisas para seu aprimoramento.
Sobre o processo de pesquisa e apresentação, Larissa comenta que, por ser a primeira vez que teve essa experiência, pode avaliar como funciona a pesquisa cientÃfica. “A pesquisa é importante e precisa ser valorizada. Nós conseguimos vivenciar isso, relacionando os conhecimentos teóricos e práticos”, conclui.
Resumo das técnicas pesquisadas pelas estudantes. Imagens: arquivos pessoais, com adaptações de Juliana Barbosa
Texto: João Cubas (Aspec/SCB/UFPR)