O álcool gel pode ser responsável pelo desenvolvimento de outras bactérias, além de não funcionar como agente antisséptico, se produzido com insumos de má qualidade ou em desacordo com as diretrizes oficiais. Esse é o alerta da professora de Microbiologia Marcia Regina Beux, do Departamento de Patologia Básica da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Em 2011, na época da epidemia de H1N1, ela conduziu uma pesquisa que confrontou marcas de álcool gel com espécies de bactérias comuns na microbiota das mãos e chegou a conclusões apropriadas também para a atual pandemia de Covid-19.
Ao utilizarmos um produto de má qualidade ou com o prazo de validade vencido, podemos contribuir para que bactérias que estejam na pele ou na superfície se proliferem, causando o efeito contrário daquele esperado. “Há um leque de microrganismos que podem se desenvolver em uma má formulação como bactérias Gram negativas e Gram positivas, esporuladas e até mesmo fungos”, conta a especialista que alerta sobre o risco de produtos de má procedência. “Podem causar infecções e até abscessos (bolsas de pus), caso haja algum ferimento na pele que sirva como porta de entrada para as bactérias no organismo”.
O álcool de boa qualidade, quando utilizado na pele, atua como um agente antisséptico, reduzindo a microbiota, ou seja, diminuindo a quantidade de microrganismos como bactérias, fungos, protozoários e vírus, residentes ou transitórios, naquele ambiente. Em superfícies, o álcool é um agente de desinfecção que reduz ou inativa a carga microbiana. “Sua ação é reportada pela capacidade de desnaturar as proteínas e remover a camada lipídica de algumas bactérias e vírus envelopados”, explica Marcia.
Fórmula ideal
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) recomenda que o álcool gel seja produzido conforme as diretrizes traçadas pelo Formulário Nacional de Farmacopeia Brasileira. De acordo com a normativa, a forma farmacêutica do álcool gel é:
Para a professora, quanto mais próxima a fórmula do produto for da recomendada, mais confiável é seu uso. “A formulação básica não contém agentes odorizantes ou hidratantes. Algumas fórmulas contêm óleos essenciais que teriam também uma função de antimicrobianos naturais”.
Outros vilões
Os sabonetes, sejam líquidos ou em barra, outros produtos de higiene pessoal e cosméticos, assim como desinfetantes, também podem se comportar como meios de cultura para microrganismos diversos. Para comprar um produto que qualidade, é importante observar no rótulo se a formulação contém agentes de conservação como ácido benzóico, ácido sórbico, clorhexidina e cloreto de benzalcônio.
Marcia não aconselha usar o álcool gel como substituto da água e do sabonete. “A utilização desse produto é viável apenas na impossibilidade de lavar adequadamente as mãos com água e sabonete”, finaliza.
Testes gratuitos
O Laboratório de Ressonância Magnética Nuclear (LabRMN), do Departamento de Química da UFPR, oferece testes gratuitos de álcool gel desde junho. O serviço de análise começou para apoiar as polícias Civil e Federal, que apuram casos de fraudes nessa indústria, e a partir de agosto foi aberto à comunidade em geral (pessoas físicas e pequenas empresas) de forma gratuita.
Para solicitar a análise, basta entregar entrar em contato através do e-mail alcoolgel@c3sl.ufpr.br e levar uma amostra do produto à guarita do Centro Politécnico da UFPR (Av. Cel. Francisco H. dos Santos, 100, Jardim das Américas).
Quem não mora em Curitiba pode enviar amostra pelo correio — apenas um mililitro é suficiente para o teste –, informando dados pessoais e de contato. O resultado é encaminhado por e-mail.
Por Jessica Tokarski, da Sucom/UFPR